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António Bagão Félix
Acácio Catarino: um homem bom e de bem

Dedico este meu espaço na Voz da Verdade ao Dr. Acácio Catarino, que nos deixou há poucas semanas.

Há pessoas com as quais não precisamos de ser “vizinhos” para nos sentirmos mais próximos. Há pessoas com as quais a relação não se constrói na extensão da quantidade, mas antes na compreensão do outro. Há pessoas com as quais percebemos mais profundamente a diferença na vida entre a conjugação do verbo ser e do verbo estar, que a nossa língua bem distingue.

O Dr. Acácio Catarino foi uma destas (poucas) pessoas que merece todo o nosso respeito e admiração. Um cidadão exemplar, um cristão serenamente inquieto, um intelectual estimulante, um servidor público incansável, enfim uma pessoa íntegra.

Nas nossas vidas, cruzámo-nos muitas vezes. Na vida pública, onde sempre beneficiei das suas reflexões tão profundas, quanto questionantes. Na vida da Igreja, na Caritas de que foi presidente durante 17 anos, ou na Comissão Justiça e Paz, quando a ela presidi, partilhando o seu permanente estudo sobre o ensinamento social da Igreja e a sua aplicação prática feita de serviço e de testemunho vivo. Na sua capacidade de juntar sabedoria ao testemunho cristão e à acção social, nas políticas sociais e no desenvolvimento do voluntariado, em suaves viagens entre o pensamento, o coração e a oração. Sempre dedicou muito do seu tempo intelectual e espiritual a causas sociais e humanitárias na sua mais nobre expressão, com a brilhante virtude do discernimento e a incessante procura do bem.

Dele sempre retive o valor axiológico da autenticidade, a singeleza humanista, a fortaleza das suas convicções, a serena coragem de um homem inabalavelmente livre. À sua busca da verdade, correspondeu o seu enraizado dever de a procurar todos os dias, mais alargada e profundamente.

Homem de firmes princípios soube sempre dar o seu testemunho com a sabedoria do estudo permanente, a exigência deontológica baseada na edificação do bem comum, na primazia do direito-dever e na dignidade e centralidade da pessoa humana. Com a sua morte, desaparece uma pessoa superior porque exigente, em primeiro lugar, consigo própria.

Acácio Catarino foi uma pessoa rigorosa e afável, coerente e generosa, tolerante e audaz, competente e personalista. Homem de fé e de esperança, é um dos maiores e melhores exemplos de dedicação ao outro, com uma generosidade sem limites. Pela maneira radicalmente serena como falava e escutava, como intelectual virtuoso e profundo, preferiu sempre a substância, a essência e a amplidão à circunstância, ao modo e à exiguidade. Fê-lo com a força da palavra, a elegância de estilo, o vigor do exemplo, a genuinidade e a espiritualidade. que nele eram naturais.

Estas breves palavras são, singelamente, o modo de exprimir a minha gratidão ao Dr. Acácio Catarino, enquanto português, cidadão, cristão e amigo.

Fica a obra e o pensamento que nos legou de um homem bom e de bem. Fica a doce convergência entre a memória do coração e o coração da memória.


(por opção pessoal, escrevo com a grafia anterior ao chamado Acordo Ortográfico)