Editorial |
P. Nuno Rosário Fernandes
Comunicação e Misericórdia para uma ‘nova humanidade’*
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Na Mensagem para o 50º Dia Mundial das Comunicações Sociais, que se celebra este Domingo, 8 de maio, o Papa Francisco convida a olhar para duas dimensões da vida que podem e devem estabelecer entre si um encontro fecundo: a Comunicação e a Misericórdia.

Será, por isso, importante olharmos para estas duas dimensões de forma distinta para encontrarmos nelas os seus lugares de comunhão.

 

Pôr em comum

Sobre comunicação todos ouvimos falar e cada um terá, com certeza, a sua própria definição e as suas ideias sobre a mesma. Podemos, no entanto, olhar para a comunicação no seu aspeto mais teórico e no seu lado mais pragmático, ou seja, o da prática da comunicação, presente em tudo o que fazemos, porque em toda a nossa vida e em tudo o que somos há comunicação.

Diz-nos Francisco que, o próprio amor, “por sua natureza, é comunicação” e deve, por isso, “levar a abrir-se, não se isolando”. Refere, ainda que, se o nosso coração e os nossos gestos “forem animados pela caridade, pelo amor divino, a nossa comunicação será portadora da força de Deus”.

É preciso ter em conta que o homem necessita de comunicar com o mundo que o rodeia e, de um modo especial, com os seus semelhantes. Essa comunicação é feita através dos sentidos que são o contacto natural e permanente com o quotidiano que o envolve. E é assim que ele se encontra constantemente recetivo e pronto para captar todas as motivações e estímulos provenientes do exterior. A comunicação é, por isso, o ato de transmitir e de receber uma mensagem, recorrendo à utilização de um código de sinais ou de símbolos.

A palavra comunicar deriva do latim ‘communis’ que, etimologicamente, significa ‘tornar comum’. E como filhos de Deus, “somos chamados a comunicar com todos, sem exclusão”, lembra o Papa Francisco. A comunicação, que é o suporte da vida em sociedade e o mecanismo pelo qual as relações humanas existem e se desenvolvem, é algo que está em contínua expansão e desenvolvimento. De tal modo que, nenhum grupo social poderia sobreviver se, entre os elementos que o compõem, não existisse uma troca de qualquer espécie de comunicação. Compartilhamos informação, ideias, atitudes, tornando-as comuns aos outros, não somente as coisas que são externas mas também os atos de consciência mais íntimos. A comunicação tem, por isso, “o poder de criar pontes, favorecer o encontro e a inclusão, enriquecendo assim a sociedade”, frisa Francisco na Mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais.

 

Coração de Deus no homem

Por seu lado, falar de misericórdia é falar da grandiosidade do coração de Deus que sai de si próprio para vir ao nosso encontro e colocar-se naquilo que são as nossas misérias, fragilidades e necessidades, em tudo o que é a nossa vida. Numa entrevista ao Papa Francisco, recentemente publicada (‘O nome de Deus é misericórdia’), o Pontífice cita Bento XVI observando que “tudo o que Igreja diz e faz é a manifestação da misericórdia que Deus nutre pelo homem”.

 

Comunicar misericórdia

Nesse sentido, Francisco aponta na mensagem para as comunicações sociais que é particularmente próprio da linguagem e das ações da Igreja “transmitir misericórdia, para tocar o coração das pessoas e sustentá-las no caminho rumo à plenitude daquela vida que Jesus Cristo, enviado pelo Pai, veio trazer a todos”.

Esta é a missão da Igreja e, por isso mesmo, é missão de todos os batizados que fazendo a experiência de acolher a misericórdia de Deus na própria vida são convidados a testemunhar essa mesma comunicação de Deus.

 

Comunicação para a paz

Porém, gera-se uma dificuldade a partir do excesso de informação e das mensagens que o recetor, neste processo de comunicação, recebe. Há um bombardeamento constante, diário, minuto a minuto, de dados a assimilar. Há um imediatismo na comunicação que permite e possibilita a reação espontânea a qualquer estímulo e que, tantas vezes, em vez de gerar comunhão, gera divisão. A comunicação, como tudo o que é criatividade divina, existe para o bem, e daí a necessidade de “escolher cuidadosamente palavras e gestos para superar incompreensões, curar a memória ferida e construir a paz”, salienta o Papa Francisco.

Na diversidade de meios, hoje existentes, as palavras não pensadas, não rezadas, não calculadas, mas saídas de uma emoção, podem impedir a verdadeira comunicação ou a comunicação da Verdade. É por isto que o Papa Francisco nos recorda que “a palavra do cristão visa fazer crescer a comunhão e, mesmo quando deve com firmeza condenar o mal, procura não romper jamais o relacionamento e a comunicação”.

 

Acolher, escutar, curar

Infelizmente, vamos assistindo, com grande predominância na rede digital, a este romper do relacionamento e da própria comunicação, seja pelo juízo, o julgamento, a condenação e, tantas vezes, o linchamento digital. Diante do que pode ser o defeito, o erro, o pecado de cada um, “não podemos julgar as pessoas, porque só Deus pode ler profundamente no coração delas”, diz o Papa Francisco. Torna-se, assim, necessário olhar a pessoa, na sua dignidade e saber respeitá-la pelo que é.

Neste sentido, a misericórdia tem, assim, a capacidade de “curar relações dilaceradas e restaurar a paz e a harmonia entre as famílias e nas comunidades”. Para tal, existe um instrumento a ter em conta, que se aplicado, com misericórdia, lhe confere um novo modo de o praticar: o diálogo. Porém, este supõe a escuta e o saber escutar. Para haver diálogo, partilha, comunicação é preciso escutar fazendo-se próximo. Quantas vezes nos queremos fazer ouvir a nós próprios, fechando portas à escuta do outro, afastando-nos, assim, do nosso interlocutor! “É um dom que é preciso implorar e depois exercitar-se a praticá-lo”, observa o Papa.

Esta escuta pode passar, também, pela rede, pelo digital, pelas novas praças públicas onde proliferam opiniões diversas, diferentes das nossas, e onde, segundo Francisco também se pode realizar “comunicação plenamente humana”. O importante é “o coração do homem e a sua capacidade de fazer bom uso dos meios ao seu dispor”. Porque, seja na rede, no encontro pessoal ou virtual, deverá estar sempre presente na comunicação, o bom senso, o respeito, a responsabilidade. Deste modo, e aliando ainda a misericórdia, poderá nascer uma ‘nova humanidade’.

 

P. Nuno Rosário Fernandes, diretor
p.nunorfernandes@patriarcado-lisboa.pt

 

* artigo escrito para a revista ‘Canção Nova’

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