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Ainda a questão demográfica na Europa (pelo Pe. Duarte da Cunha)

Esta época do ano, com a proximidade do Natal, não pode deixar de nos fazer pensar no mistério do nascimento de cada criança e na vida nascente. Aliás, esta foi a proposta do Papa para o primeiro Domingo do Advento que tantas dioceses e movimentos em todo o mundo acolheram. Talvez possa também ser uma boa ocasião para voltarmos a falar do tema da demografia na Europa. Esta é a mais complicada e talvez a mais grave de todas as crises por que estamos a passar. Ela tem, certamente, muitas raízes noutros problemas e na mudanças sociais, mas também está na origem de tantas outras crises entre as quais não é secundária a falta de esperança.

A Europa está, de facto, a entrar num período de autêntico inverno demográfico. O índice demográfico é em quase todos os países europeus abaixo – muito abaixo até – dos 2,1 filhos por mulher em idade fértil. Isto significa que a população está a envelhecer e a diminuir. Se em alguns países da Europa ocidental ainda não se sente esta diminuição deve-se sobretudo ao facto de continuarem a chegar imigrantes. Mas nos países da Europa de Leste onde, além da baixíssima taxa de natalidade e do elevado número de abortos que continuam a fazer-se, existe uma forte emigração que faz as pessoas em idade fértil abandonar o país, já se nota este inverno demoráfico de uma maneira dramática.

Basta pensar que em 1960, em média na Europa, 27,1% da população tinha menos de 14 anos e só 13,5% mais de 65 anos. Hoje, só 15,2 % tem menos de 14 anos e 25,5% tem mais de 65 anos. A continuar neste ritmo prevê-se que em 2050, 34% da população terá mais de 65 anos (muitos com mais de 85 anos) e só 11,9 terá menos de 14 anos. Isto não pode deixar de ter implicações económicas, mas também espirituais e sociais.

O que está por detrás desta inversão da pirâmide de idades? Sem dúvida que há aspectos positivos, como o prolongamento da esperança de vida e a melhoria dos cuidados de saúde. Mas é estranho que quando os partos são cada vez mais bem sucedidos haja muito menos crianças a nascer. Basta ver que as famílias sem filhos hoje na Europa são cerca de 41%, as que têm um filho são 27% e as que têm três filhos ou mais são apenas 8%. Isto faz perceber que há mais do que mudanças nos cuidados de saúde, há uma maneira diferente de olhar para a questão de ter ou não filhos e por isso podemos concluir que entre as causas da queda demográfica há questões culturais e espirituais.

As razões serão variadas e dificilmente podemos fazer juízos de valor sobre as decisões de cada casal em concreto. Contudo, parece ser cada vez mais evidente que estamos a viver as consequências do desprezo da profecia do Papa Paulo VI na Humanae Vitae. O facto de se ter separado o significado unitivo do procrativo no acto conjugal com a difusão da contracepção, fazendo com que os filhos passassem a ser uma escolha do casal que decide se quer ou não receber mais filhos, muitas vezes sem razões profundas, tomando nas suas mãos o que antes estava nas mãos de Deus, não pode deixar de ter consequências. Claro que a apoiar esta tendência para se ter menos filhos há questões económicas muito sérias. E aqui importa perceber que também o Estado tem as suas responsabilidades. Seria razoável que o Estado apoiasse mais as famílias numerosas, que valorizasse o nascimento de filhos e beneficiasse as famílias que contribuem com mais filhos. Mas como infelizmente os nossos políticos governam para 4 anos e as consequências das mudanças demográficas não parecem tão urgentes preferem construir estradas e aeroportos. Mas quem dará esperança à nossa sociedade? Quem irá cuidar dos idosos no futuro?

Mais uma vez os cristãos são chamados a ser neste mundo uma luz especial e a remar contra a maré. Na Áustria, embora a taxa de natalidade seja muito baixa: cerca de 1,4%, a taxa de natalidade dentro das famílias católicas praticantes é de 2,4%. Não porque tenham mais dinheiro. Mas porque a descoberta do amor de Deus, a solidariedade entre famílias, a estabilidade nos casamentos, as faz ter mais consciência do valor da vida e da missão de uma família cristã. Não será que também por tudo isto a Evangelização tenha de ser levada mesmo a sério? Sem Jesus Cristo a tendência da Sociedade será sempre a de ir de depressão em depressão, de medo em medo, de egoísmo em egoísmo. Quando Jesus é acolhido aumenta a consciência da missão, a alegria de se poder contribuir para a construção do futuro, a disponibilidade para se ter filhos. É caso para lembrar que o Natal é o anúncio de uma luz que brilha nas trevas.