Cáritas de Lisboa |
Ao encontro de quem é explorado, perde dignidade, casa e trabalho
“A caridade é o impulso do coração que nos faz sair de nós mesmos”
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«Eu vi a miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi o seu grito por causa dos seus opressores; pois eu conheço as suas angústias» (Ex. 3,7).

Este apelo de Deus é tão atual, que nos deve interpelar, deixar-nos inquietos, desassossegados face à indiferença e às injustiças dos nossos dias.

A imigração é um assunto que todos conhecemos, e que entra continuamente nas nossas casas através dos meios de comunicação social. Quantos são os irmãos nossos que morrem no Mar Mediterrâneo e em tantos outros lugares, quantas as vítimas do tráfico humano, prostituição e escravatura laboral?!? A maioria destes imigrantes busca apenas a melhoria da qualidade de vida para si e para sua família. É legítimo a cada pessoa defender a sua dignidade.

Como cristãos devemos recordar-nos do mandamento de Jesus: «ama o próximo como a ti mesmo» (Mt. 22,39). Se colocarmos em prática este repto de Deus, o outro torna-se próximo, a sua dor preocupa-nos, a sua história interessa-nos.

O nosso país continua a necessitar de mão de obra para vários serviços (construção civil, agricultura, restauração, serviços domésticos, etc.), mas, infelizmente, nem sempre consegue garantir os direitos mínimos aos imigrantes (casa, saúde, educação, alimentação).

Nestes últimos dois anos tenho acompanhado vários imigrantes que trabalham na agricultura na zona das Caldas da Rainha. Existem vários problemas: assiste-se à falta de recursos humanos para a execução de trabalhos sazonais, nomeadamente, para a apanha de batata-doce, morangos, tomate, pera-rocha, maçãs, uvas, entre outros. Por vezes os produtos ficam por apanhar por falta de recursos humanos.

Muitos empregadores recorrem a empresas de trabalho temporário que oferecem trabalhadores, sobretudo imigrantes, para a realização destes trabalhos agrícolas. Porém os valores pagos a estes trabalhadores acabam por ser muito baixos. Uma grande parte vai para a empresa temporária, o que é uma injustiça para com os trabalhadores, ainda que seja legal, devido aos descontos legais e ao pagamento das comissões devidas.

Perante isto, é necessário encontrar soluções que garantam aos imigrantes o acesso ao emprego, aos empregadores recursos humanos e aos trabalhadores condições de habitabilidade, com a cooperação das autoridades competentes, nomeadamente, dos municípios.

Um outro grande tema que mexe com muitos interesses económicos é o da habitação. Assiste-se, nestes casos, à falta de habitação com preços acessíveis para os trabalhadores, e muitas soluções encontradas acabam por ser bloqueadas pelas autoridades, que acabam por encerrar os alojamentos por considerarem que não são adequados, ainda que estes tenham condições dignas para os trabalhadores.

Nestes últimos três anos têm vindo a aumentar a construção de barracas no concelho de Loures, em simultâneo também amentaram as suas demolições por ordem das autoridades governamentais locais. Vivemos uma guerra sem fim. Todos os dias somos confrontados com despejos de famílias, que foram postas na rua porque já não conseguiam pagar os setecentos ou oitocentos euros mensais de renda. As famílias, com os salários miseráveis, já não conseguem fazer face aos aumentos do custo de vida. Um quarto na zona de Camarate não se consegue por menos de quatrocentos euros. Os sem-abrigo não param de aumentar.

Muitas destas famílias são monoparentais, caindo a responsabilidade económica sobre as mães, que são obrigadas a trabalhar durante largas jornadas para poderem sobreviver. As crianças, adolescentes e jovens, ficam entregues a si próprios ou a alguma pessoa amiga, durante o tempo que não estão na escola – o que tem graves implicações no seu rendimento escolar e no seu relacionamento e desenvolvimento social e emocional. Constata-se em algumas famílias o aumento da violência doméstica, de problemas relacionados com doenças mentais, consumo de álcool e drogas.

Muitos são os desafios e as injustiças com as quais estas pessoas têm de se confrontar diariamente, tais como: aceitar um trabalho sem um contrato legal ou (recibos verdes), ficando sujeitos a receber o que a empresa quiser pagar; muitos trabalhadores não recebem o salário mínimo estabelecido por lei. Esta realidade encontra-se mais frequentemente presentes na construção civil, no trabalho agrícola, na restauração, nos serviços domésticos.

Outra das grandes dificuldades é a “guerra dos papéis”. Somos perseguidos e maltratados por um sistema burocrático, com infinitas incongruências e artimanhas, o que dificulta a vida a tudo e todos, fazendo-nos sentir cada vez mais impotentes, perante os inúmeros e complexos problemas com que os imigrantes se deparam todos os dias.

Perante todas estas realidades, continuamos com fé e esperança, contribuindo para a criação de uma sociedade mais fraterna, mais justa, mais solidaria, mais humana, confiantes que Deus sempre acompanha a história da humanidade, que sempre lhe é fiel, e que apesar dos nossos limites, Deus sempre acontece. «O ser humano está feito de tal maneira que não se realiza, não se desenvolve, nem pode encontrar a sua plenitude «a não ser no sincero dom de si mesmo» aos outros.» (Fratelli Tutti)

O Papa Francisco tem vindo a recordar-nos que todas as pessoas são chamadas a viver o amor e a caridade concreta, especialmente com as pessoas mais necessitadas, com os pobres e os doentes, e que as obras de solidariedade da Igreja católica devem ser feitas de coração e com humildade, já que não podem ser “um assistencialismo para tranquilizar consciências”. Viver a caridade é compromisso e missão de toda a Igreja, por isso é necessário reforçar as Caritas diocesanas e paroquiais, que animem e acompanhem o compromisso de toda a comunidade com os excluídos. «A caridade alegra-se ao ver o outro crescer, e de igual modo sofre quando o encontra na angústia: sozinho, doente, sem abrigo, desprezado, necessitado… A caridade é o impulso do coração que nos faz sair de nós mesmos gerando o vínculo da partilha e da comunhão.» (Papa Francisco)

texto e fotografias pelo Irmão Zé Manel, Comboniano, em Camarate (Loures)
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