Por uma Igreja sinodal |
Sínodo
Uma Igreja constitutivamente sinodal segundo o Papa Francisco
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Nove anos passados, quem lê, ou ouve e vê, a primeira saudação do Papa Francisco, após a eleição, a partir da varanda central da Basílica de S. Pedro, encontra nas suas primeiras palavras o programa do seu pontificado. Seria de citar todo texto, mas por razões práticas citamos apenas este excerto: “E agora iniciamos este caminho, Bispo e povo... este caminho da Igreja de Roma, que é aquela que preside a todas as Igrejas na caridade. Um caminho de fraternidade, de amor, de confiança entre nós. Rezemos sempre uns pelos outros. Rezemos por todo o mundo, para que haja uma grande fraternidade. Espero que este caminho de Igreja, que hoje começamos e no qual me ajudará o meu Cardeal Vigário, aqui presente, seja frutuoso para a evangelização desta cidade tão bela!”. É assim que a 13 de março de 2013, Francisco inaugura um longo processo de reformas que implicam uma mudança de paradigmas, estruturas existentes e a gestação de novas práticas que conduzirão a uma Igreja constitutivamente sinodal. E o que significa uma “Igreja constitutivamente sinodal”? Significa que a sinodalidade não se reduz a algo meramente operativo, que este processo sinodal em curso, não é mais um sínodo, como os anteriores sínodos, mas é a forma e o estilo de ser Igreja, em que o modo de ser, viver e agir como Povo de Deus realiza-se “quando caminha em conjunto, quando se reúne em assembleia e quando todos os seus membros participam ativamente na sua missão evangelizadora” (CTI, A sinodalidade na vida e na missão da Igreja, 2 de março de 2018, 6).

Sem referir uma única vez a palavra “sínodo”, mas repetindo por três vezes a palavra “caminho” — como sabemos, a palavra sínodo é composta pela preposição syn” (“com”) e “hodos” (“caminho”), e significa o caminho que os membros do povo de Deus realizam em conjunto —, e colocando o Bispo e povo a caminharem juntos, o Papa expressa a convicção profunda de que “o caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milénio”. Não é exagero afirmar que esta saudação inicial é a síntese de todo o seu pensamento eclesiológico, missionário e da conceção que tem do ministério o bispo de Roma, porque nela se encontra o essencial da ação pastoral que tem preconizado ao longo do pontificado.

Será que o Papa Francisco foi especialmente iluminado naquele dia pelo Espírito Santo, ao ponto de ser tão clarividente e profético na apresentação do seu programa pastoral? Sem colocar em dúvida a ação do Espírito Santo, num contexto tão especial como o da eleição de um Papa, e na consequência da resignação histórica de Bento XVI, as palavras do Papa Francisco podem ser tudo, menos improvisadas e/ou circunstanciais, mas fruto de um pensamento maturado ao longo dos anos e certamente confirmadas pelo muito que foi dito nas congregações gerais que precederam o conclave. De outro modo, quando o cardeal Jorge Mario Bergoglio, arcebispo de Buenos Aires, aceita a sua eleição como Papa, e pensa no que tem dizer à cidade de Roma e ao Mundo, ele sabe muito bem o que quer dizer e o que é preciso fazer. Porquê? Essencialmente porque o Papa recém-eleito é um profundo conhecedor do sentir do “santo povo de Deus” — expressão que lhe é cara —, da profunda clivagem entre hierarquia e leigos, o “tal” clericalismo, que na expressão mais grotesca resulta em abusos de poder de vária ordem, com consequências sempre muito graves para as vítimas e para a Igreja, e que tem bem presente a urgência de uma renovação eclesial inadiável, que passa por uma opção missionária “capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à auto-preservação. A reforma das estruturas, que a conversão pastoral exige, só se pode entender neste sentido: fazer com que todas elas se tornem mais missionárias, que a pastoral ordinária em todas as suas instâncias seja mais comunicativa e aberta, que coloque os agentes pastorais em atitude constante de «saída» e, assim, favoreça a resposta positiva de todos aqueles a quem Jesus oferece a sua amizade” (Evangelii Gaudium, 27).

 

O atual pontificado inaugura uma nova receção do Concílio Vaticano II, dando centralidade ao capítulo II da Lumen Gentium, lembrando-nos o que parece termos esquecido: “ser Igreja significa ser povo de Deus, de acordo com o grande projeto de amor do Pai” (EG 114). Esta é uma grande oportunidade que o Papa Francisco nos oferece para aprofundarmos o que significa ser Igreja.

 

Um dos elementos centrais desta eclesiologia, para o qual Francisco tem chamado à atenção, é a teologia e a prática do sensus fidei fidelium (LG 12). Na Evangelii Gaudium, o Papa retoma esta doutrina conciliar deste modo: “Em todos os batizados, desde o primeiro ao último, atua a força santificadora do Espírito que impele a evangelizar. O povo de Deus é santo em virtude desta unção, que o torna infalível «in credendo», (…) Deus dota a totalidade dos fiéis com um instinto da fé – o sensus fidei – que os ajuda a discernir o que vem realmente de Deus” (EG 119). É em razão desta presença e ação do Espírito Santo em todos os batizados que o Papa faz da sinodalidade um eixo central do seu pontificado, dando sinais, desde o sínodo sobre a família, com a Assembleia Geral Extraordinária (2014), que queria uma participação mais ampla do povo de Deus nos processos decisórios que dizem respeito a toda a Igreja e a todos na Igreja. Para Francisco a participação de todos os fiéis na vida eclesial passa necessariamente por promover processos de escuta, diálogo e discernimento comunitário, pedindo ao Espírito Santo “o dom da escuta: escuta de Deus, até ouvir com Ele o grito do povo; escuta do povo, até respirar nele a vontade a que Deus nos chama” (Discurso do Papa Francisco na Vigília de oração preparatória para o Sínodo sobre a Família, 4 de outubro de 2014). 

 

O sínodo em curso, “Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”, é o primeiro grande passo, ensaio e laboratório de uma Igreja constitutivamente sinodal. A realização do “que o Senhor nos pede” e que “de certo modo está já tudo contido na palavra «Sínodo». Caminhar juntos – leigos, pastores, Bispo de Roma – é um conceito fácil de exprimir em palavras, mas não é assim fácil pô-lo em prática”, avisa-nos Francisco.

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