DOMINGO XI COMUM Ano B
"A que havemos de comparar o reino de Deus?
Em que parábola o havemos de apresentar?”
Mc 4, 30
Ponho-me, às vezes, a imaginar as parábolas que Jesus contaria hoje, a partir da nossa vida urbana, computorizada, e tão frenética em informações. Que simbolismos encontraria no que somos e fazemos para nos falar do Reino? Pois as histórias simples que os evangelhos nos guardaram, falam do reino de Deus a partir da vida quotidiana, “picam-nos como a urtiga”, como gostava de dizer o biblista Carlos Mesters, e não nos deixam na mesma. Mais do que um conhecimento conceptual movem-nos para um dinamismo existencial, mais do que ideias, colocam-nos em relação com o Deus vivo e com a vida que Ele nos oferece.
A grandeza da missão de Jesus contrasta com a “insignificância” do seu método! Dirão alguns entendidos: “Histórias contam-se às crianças! As grandes mudanças do mundo fazem-se com políticas acertadas, com o poder bem orientado, e com chefes esclarecidos!” Qual o poder da lógica do mistério, do fermento na massa, do tesouro escondido, da semente que cresce sem o semeador dar conta? As parábolas reenviam-nos à simplicidade das situações humanas, onde fazemos a experiência de uma generosidade de vida que é maior do que nós, da qual beneficiamos e nos tornamos responsáveis. Elas revelam o poder e a grandeza do que é pequeno, do que é desprezado pela soberba de “quem é importante”, do que pode crescer e tornar-se grande sem ser pela força ou pela opressão. E esse é o único modo do reino se tornar grande: engrandecendo o que era insignificante e elevando o que era espezinhado!
Não há frutos sem sementeira. E da natureza recebemos a lição de uma abundância que não controlamos: pode haver acidentes e imprevistos, mas cada semente tem um factor de multiplicação inesperado. E o que dizer das pessoas quando são valorizados os seus esforços, o empenho e a entrega, o próprio sacrifício que é palavra tão envergonhada na comum linguagem dos prazeres? Dói-me ver como tantas crianças e jovens são pouco incentivados e animados a esforçarem-se na sementeira do saber e do trabalho, quantas vezes pela indiferença dos próprios pais. Há dias ouvi uma expressão que descrevia a excessiva protecção, disfarçada de amor, de alguns pais: “Eles ‘coitadinham’ os filhos!”
O reino de Deus não é para “coitadinhos”, e a sementeira a que Jesus convoca é para quem O quer seguir. Para quem acredita na força de pequenos gestos de humanização: no diálogo que acolhe, na partilha que gera criatividade, na inclusão que dignifica, na bondade que se contagia. Mesmo quando parecem enormes as mudanças a fazer, e a tentação de desistirmos ou pensar que só os “grandes deste mundo” podem mudar alguma coisa, ainda aí, semear não é facultativo! Como dizia Miguel Torga, “todo o semeador / Semeia contra o presente. / Semeia como vidente / A seara do futuro, / Sem saber se o chão é duro / e lhe recebe a semente.” Há um crescimento e uma fecundidade que serão sempre dom de Deus! Como são dons as sementes que cada pessoa tem para dar! Que ninguém fique “coitadinho” no seu canto!
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