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Páscoa
A pedra do sepulcro
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A cena das mulheres correndo para o sepulcro no dealbar daquele primeiro dia da semana contém um profundo simbolismo para a vida dos discípulos e constitui um alerta contra as ilusões que os podem envolver.

 

Descobrir a vida onde parece estar a morte
Foi no dia de Páscoa que, depois da Eucaristia no bairro, fomos dar uma vista de olhos à horta. Aquele lugar que meses antes só mostrava mato e lixo, estava agora completamente transformado com hortaliças de todo o tipo a cobrirem a superfície com um manto verde matizado, desde o claro das alfaces ao carregado da tronchuda. E falávamos: em boa hora a Câmara tomou a iniciativa de permitir aos já numerosos hortelãos, que a medo iam cultivando os recantos mais escondidos, de o fazerem abertamente, como ainda de alargar o espaço e prepará-lo para que, mediante um concurso, mais moradores pudessem cultivá-lo. E são só vantagens que isso acarreta: o mato, o lixo e ocupações indevidas são substituídos por produtos naturais, com maior valor nutritivo do que muitos que enxameiam as lojas; a ocupação das pessoas numa altura de desemprego crítico constitui um preventivo contra o ócio e seus frutos; em tempo de carestia o melhor é deitar mãos ao trabalho e não estar à espera dos outros para prover às necessidades.

 

 O ídolo que nos engana
A visita lembrou-nos que também agora é tempo de abrir os olhos e deixar-se de desculpas e de ir exorcizando as alienações que foram enredando a nossa vida. Já falámos muito das causas da crise: viver acima dos meios de que dispomos, consumismo, falta de produtividade e consequente competitividade e outras mazelas que dão cabo de nós. Mas essas são apenas manifestações de um mal maior: a alienação do deus Mamon, do dinheiro, da finança e a idolatria gerada à sua volta; a ideologia que absolutiza o mercado sem controlo ético e político, que coisifica as pessoas e afunda irremediavelmente os mais pobres, desfigura o projeto democrático e deixa-nos presos e desarmados no meio da trama. As transformações materiais que os fundos europeus possibilitaram, a “solidariedade” que a comunidade manifestou, as opções nos investimentos de grande vulto, acabaram por nos deixar ver que o deslumbramento do progresso se virou contra nós. Vestiram-nos, ainda em crianças, com uma farda de adultos, transformando-nos em figurantes para a fotografia. Fizeram exigências de qualidade de tal ordem que, se não fossem trágicas, seriam cómicas. Criou-se uma estrutura tão democrática e humanista que parece uma sociedade perfeita: sem a palavra democracia não há projeto que avance; qualquer expressão que soe a racismo e colonialismo provoca um terramoto; apresenta-se o planeta como a criança a tratar com luvas de veludo; as liberdades têm que emoldurar tudo o que é documento; o diálogo e a tolerância têm que figurar em todo o discurso. Mas, na hora da verdade, tudo é diferente: os governantes não são decisores, apenas mediadores na execução das ordens emanadas dos senhores da finança; esses que tratam os cidadãos, ainda que envolvidos em vistoso manto de direitos, como lixo; simplesmente lixo. Já tínhamos ouvido falar dos dias negros do “crash” de Wall Street em Outubro de 1929; já tínhamos percebido a maneira como o FMI e o BM tratavam os países mais pobres quando se fazia campanha pelo perdão da dívida externa; surpreendiam-nos as “medidas draconianas” que sentenciavam. Continuam iguais. Mas agora batem à nossa porta.

 

Túmulo vazio, sinal em frente
Como então preocupamo-nos às vezes mais com a pedra do sepulcro do que em saber que ele está vazio e que o Vivente quer ser procurado, para nos mandar pôr a caminho e as mãos ao trabalho. Comecemos pelo mais simples, como aqueles que, já pouco tendo, vão garantindo o que precisam ainda que seja com uma horta. Isto também implica não abdicar de exigir que o Estado não fuja às suas responsabilidades; afinal os governantes foram lá colocados por nós. Não podemos ser apenas figurantes ao serviço de uma imagem que se quer apresentar no templo dos poderosos perante o ídolo do dinheiro, deixando-nos à mercê de esmolas quando a nossa dignidade impõe que ganhemos o pão que nos sustenta. O sepulcro vazio é sinal para andar e não para parar.

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