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O desafio de uma mulher portuguesa
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Fátima acolheu, por estes dias, o Congresso Internacional ‘Ordem da Imaculada Conceição – 500 anos. Santa Beatriz da Silva: Estrela para Novos Rumos’. José Félix Duque, investigador do CEC/FL – Universidade de Lisboa, foi um dos oradores do congresso e nesta edição reflecte sobre o exemplo de santidade de uma mulher portuguesa que não perdeu actualidade.

Em 1976, o Papa Paulo VI canonizou a primeira mulher nascida em Portugal a receber as honras dos altares – Santa Beatriz da Silva, fundadora da Ordem da Imaculada Conceição. As manifestações de culto datavam do final do século XV, imediatas à sua morte, ocorrida na cidade castelhana de Toledo, a 9 de Agosto de 1492. Se, naquela data, era pouco conhecida, hoje a sua situação começa a ser diferente. Os dois mosteiros portugueses da sua Ordem (em Campo Maior e em Viseu) têm contribuído largamente para uma maior devoção. Por outro lado, a sua vida e obra têm interessado os investigadores. Em boa hora, não só porque é uma Santa do nosso hagiológio nacional, como porque a sua Ordem é das mais interessantes do monaquismo peninsular.

Dona Beatriz da Silva nasceu por volta de 1437, em Campo Maior, de uma família nobre. Cedo partiu para Castela como donzela de Dona Isabel, prima do Rei Dom Afonso V, quando esta se casou com o Rei Dom João II daquele reino. Pelos treze anos de idade, fez um voto de virgindade e decidiu morar no Mosteiro de São Domingos, o Real, em Toledo. Nunca tendo professado, ali ficou por mais de trinta anos, como hóspede. Dedicou-se à oração, à penitência e à caridade, usando um véu branco sobre o rosto. A sua fama de santidade expandiu-se pela cidade e chegou à nova monarca, a Rainha Dona Isabel, a Católica, que a visitou. Dona Beatriz desejava fundar um mosteiro dedicado à Conceição da Virgem, uma devoção popular, mas teologicamente problemática. Pediu então à Rainha apoio para a fundação. Em 1489, enviaram uma súplica à Santa Sé e obtiveram a bula Inter Universa, do Papa Inocêncio VIII, fundando o Mosteiro da Conceição, gérmen da Ordem. Este estaria integrado na Ordem de Cister, mas teria características próprias: obediência ao bispo, um título que exaltava a Conceição, uma liturgia própria, um hábito próprio, o poder de eleição abacial, o poder de dispensa de jejuns sem o parecer de médicos, o poder de comer carne, o poder de dispensar o uso de vestes de lã (substituindo-a por linho), o poder de escolher os seus próprios capelães e confessores, privilégios espirituais na Quaresma e na agonia; e o poder de admitir à profissão mulheres iletradas. Estas características, pedidas por Dona Beatriz, configuravam uma nova Ordem, com carisma próprio e amplas margens de autonomia. Esta daria possibilidade às mulheres de participarem simbolicamente nos acesos debates sobre a Imaculada Conceição. Atribuía-lhes, ainda, uma dignidade sem igual, por associá-las à figura poderosa da Virgem imaculada. As monjas vestiriam hábito e escapulário brancos, e manto azul. Exibiriam medalhões da Virgem rodeada de raios e com a lua aos pés. Cingir-se-iam com um cordão semelhante ao dos franciscanos, expressando, assim, identificação com a defesa que estes faziam da tese imaculista.

Dois anos depois da sua morte, a Rainha decidiu passar o Mosteiro à Ordem de Santa Clara, transformando as conceicionistas em ramo das clarissas. Era a reforma monástica, à cabeça da qual colocou o seu confessor franciscano, o Cardeal Cisneros. Fundaram-se então muitos mosteiros semelhantes. Em 1511 – há 500 anos –, e depois de muitas dificuldades, as suas discípulas alcançaram do Papa Júlio II a Regra da Conceição. Esta concessão admitiu existir na Igreja uma nova Ordem. São hoje cerca de 3. 000 monjas que, em clausura, dedicando-se à oração e ao trabalho, vivem para Deus e para o próximo em contemplação, adorando Cristo e venerando a Virgem sem mácula.

A Ordem da Imaculada Conceição, tal como na época da fundação, é hoje o desafio de Santa Beatriz ao mundo, que vive num tempo de crises e de contradições. De facto, urge contemplar, isto é, dar lugar à Fé, à Esperança e à Caridade, virtudes que exercitou e ensinou como mestra de vida, deixando-nos o exemplo da sua santidade que, apesar da passagem do tempo, não perdeu actualidade.

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