Lisboa |
Centenário do nascimento de São de Alenquer (1923-1940)
“Uma rapariga normal, mas profundamente sobrenatural”
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A São de Alenquer “é um exemplo para os jovens de hoje”. A garantia é do padre Ricardo Figueiredo, autor da mais recente biografia da jovem de Abrigada, cujo processo da causa de canonização está a decorrer em Roma. “Viveu o normal de uma vida cristã profunda, séria e sobrenatural”, sublinha.

 

No centenário do nascimento de Maria da Conceição Froes Gil Ferrão de Pimentel Teixeira (Coimbra, 1 de fevereiro de 1923 - Lisboa, 6 de junho de 1940), desde sempre conhecida como a Sãozinha da Abrigada, a publicação do livro ‘«Só n’Ele» confio - Biografia espiritual de São de Alenquer’ mostrou uma nova faceta desta jovem, que tem em curso o processo de canonização. “Os amigos e as amigas, sobretudo, vão ter um papel muito importante na vida dela. E aqui a novidade da biografia que escrevi: ao ir buscar as cartas às amigas, que eram desconhecidas até agora, vemos cartas de uma menina normal, uma rapariga normal, com um grupo de amigas, que planeia festas, que diz como iam contratar a música, etc. Ao mesmo tempo, vive tudo isto com um grande sentido de Deus, vive com o coração sempre com este desejo de ser fiel a Deus, de querer fazer a vontade de Deus. A São viveu aquilo que era o normal de uma rapariga da sua época; e, ao mesmo tempo, aquilo que é o normal de uma vida cristã profunda, séria e sobrenatural”, explica ao Jornal VOZ DA VERDADE o padre Ricardo Figueiredo, autor da obra publicada recentemente pela Paulus Editora.

Após a investigação que fez, o sacerdote não tem dúvidas sobre o verdadeiro “perfume de santidade” da vida de São. “Houve uma imagem e uma ideia da Sãozinha que foi passada até agora, muito fruto da época em que ela viveu, de alguém com uma vida cristã séria – e é verdade –, mas o que se procura agora demonstrar, e a biografia que escrevi foi muito nesse sentido, é que, ao mesmo tempo, vive uma vida normal. Muitas vezes, esta ‘vida normal’ não passava nas apresentações que se faziam da vida dela, até agora. Acho que esse é o grande perfume de santidade da vida dela. A São ter sido uma rapariga profundamente normal e, na sua normalidade, profundamente sobrenatural”, considera este sacerdote.

 

Doação aos outros

São de Alenquer foi uma jovem da alta sociedade portuguesa, que viveu pouco mais de 17 anos. “A São é uma filha do seu tempo. Estamos numa fase da história em que a Igreja estava a reconfigurar-se, depois daqueles anos da Primeira República em que houve a perseguição, e a São nasce neste ambiente que vemos até nos seus pais: a mãe era profundamente religiosa, de uma espiritualidade muito séria, muito testemunhal, muito dura, até; e o pai, nascido numa família católica, andou em colégios católicos, mas quando se formou em Medicina, em Coimbra, por altura da Implantação da República, bebeu aquilo que eram as ideias da época, a ideologia que defendia o cientismo, o cientismo ateu, e abandona a fé. Nos pais da São, duas pessoas da alta sociedade portuguesa, vemos aquilo que era a situação social e cultural do nosso país”, observa o padre Ricardo, destacando, contudo, o papel da mãe: “A São é muito marcada pela mãe, nesta opção por viver a vida católica com um sentido muito profundo do que era a fé, com as traquinices próprias de criança. Quando saía da Missa, por vezes dizia: ‘Se demorasse mais um bocado, já não conseguia estar quieta’. Gostava de rezar, ensinada pela mãe, e sempre com profundidade. Quando sentiu que o pai não vivia uma vida de fé, foi um grande sofrimento para aquela menina”.

Maria da Conceição Pimentel Teixeira nasce em Coimbra, “onde os pais estavam a viver”, foi batizada em Gavião, “por ser a terra da família”, e depois o pai vai trabalhar para a Abrigada, ficando também como médico na Base Militar da Ota. “Era a vida normal de uma criança da alta sociedade da época. Recebeu formação e educação em casa, e quando foi para a escola, na Abrigada, teve alguns problemas com a professora por estar mais avançada. Muitas vezes, queria o encargo de ajudar outros colegas a estudar, sempre aprendendo esta doação aos outros, desde muito nova, em casa, e no cuidado com os pobres. A generosidade com os pobres é uma marca da São. O aprender a viver este cuidado e este serviço”, refere.

 

Confiança em Deus

O padre Ricardo Figueiredo escreveu o livro ‘«Só n’Ele» confio - Biografia espiritual de São de Alenquer’ por desafio do vice-postulador da causa de canonização, padre Paulo Pires. “A minha primeira resposta foi ‘Não’”, assume. “Quando eu tinha 15-16 anos, li a biografia da São escrita pela mãe, ‘Vou para o Céu’, e não gostei exatamente porque focava uma vida interessante, uma vida cristã sobrenatural, com certeza, mas com pouca ligação àquilo que são os nossos dias. Pensava que era uma vida ‘congelada’ na época em que viveu, que não dizia nada aos jovens de hoje”, justificou, então, ao sacerdote amigo, que o convida a ler “outra biografia, do padre Oliveiros de Jesus Reis”. “De facto, encontro uma São bastante diferente, mas sentia que havia algo da vida dela que não me estavam a ‘contar’. Fui ao Instituto da Sãozinha pegar na documentação, vou vendo as cartas aos pais, aos tios, aos avós, às amigas, e aí descubro uma São que não tinha encontrado e me entusiasmou muito”, assume.

Dessas cartas, o autor destaca um ponto “muito curioso”. “Elas escreviam sobre os namorados e é muito bonito ver a São a dar conselhos sobrenaturais sobre o namoro e sobre como elas têm de escolher o rapaz que Deus quer, que isso as vai ajudar a viver a vida cristã e a viver uma vida séria. É muito bonito ver isso nos conselhos de São”, frisa. “Encontrar esta São normal foi o sinal que precisava e escrevi com muito gosto esta biografia que agora foi publicada”, garante o padre Ricardo Figueiredo.

Sobre o título da obra – ‘«Só n’Ele» confio - Biografia espiritual de São de Alenquer’ –, o autor lembra a confiança divina da jovem biografada. “O título do livro nasce quando a São está doente e os pais estão muito preocupados. Ela diz sempre: ‘Paizinho, mãezinha, gosto muito de vocês, mas só em Deus confio’. O pai era médico e estava a tratar da filha, mas, mesmo diante da Medicina, a grande confiança dela era em Deus! Isto é um traço muito marcante da vida da São”, salienta o padre Ricardo, assegurando que a São de Alenquer “é um exemplo para os jovens de hoje”. “Mostra que é possível viver com seriedade a vida cristã”, considera.

 

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Sãozinha da Abrigada ou São de Alenquer?

“Isso está esclarecido no livro ‘«Só n’Ele» confio’. A grande questão é: neste acesso às cartas, o que me dei conta é que não só ela assinava como ‘São’, como ela era tratada por ‘São’. Sãozinha surge posteriormente à sua morte, por desejo da mãe, que a procura ligar muito a Santa Teresinha do Menino Jesus. Por isso, nesta nova perspetiva e nesta documentação mais real e concreta sobre a São, preferi mudar o nome, para dar uma perspetiva mais real da sua vida.”

Padre Ricardo Figueiredo

 

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São de Alenquer venerável durante a JMJ Lisboa 2023?

O vice-postulador da causa de canonização da serva de Deus Maria da Conceição Pimentel Teixeira explica em que fase está a processo, que foi introduzido em 1994. “O processo está em Roma. Tudo o que diz respeito à fase diocesana, está terminado há vários anos. Segundo o postulador, estava em falta uma perícia histórica sobre a biografia realizada pela mãe. Ou seja, a grande biografia que se tem, a obra mais desenvolvida, ‘Vou para o céu’, foi escrita pela mãe e, para a canonização, são precisos dados concretos e, sobretudo, imparciais. Por isso, era necessário fazer uma perícia histórica que ajudasse a contextualizar essa biografia, conferindo-lhe precisamente o valor de documento, que não seja simplesmente um documento afetivo”, explica ao Jornal VOZ DA VERDADE o padre Paulo Pires. Este sacerdote, que sucedeu nesta missão ao cónego Álvaro Bizarro, no final de 2018, refere que “a perícia histórica já está feita”. “Quando entrei no processo, a perícia já estava em andamento. Tinha sido pedida à Professora Doutora Manuela Mendonça – que assina o prefácio do livro do padre Ricardo Figueiredo –, foi concluída e foi enviada para Roma”, refere. “Da nossa parte, não podemos fazer mais nada. O processo está do lado de Roma”, acrescenta, lembrando que “a única tarefa” que o postulador lhe deu foi “averiguar possíveis milagres que sejam verosímeis”. “Precisamos de conhecimento de situações que possam eventualmente configurar uma situação de milagre”, expõe o padre Paulo, partilhando um desejo secreto: “Quando o postulador concluir todo o processo e for ao tribunal da congregação, daí poderá resultar o título de venerável. Disse ao senhor Patriarca que gostava muito que, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, o Papa Francisco pudesse declarar a São como venerável, na sua terra natal”.

 

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Jovens chamados a ser santos

Ordenado em 2015, o padre Ricardo Figueiredo escreveu, nestes oito anos de sacerdócio, entre outros, cinco livros biográficos sobre jovens exemplos de santidade: ‘Um «Santo» Surfista - O servo de Deus Guido Schäffer’, ‘Não eu, mas Deus - Biografia espiritual de Carlo Acutis’, ‘Nunca foi tão fácil ganhar o Céu! - Biografia espiritual de São José Sánchez del Rio’, ‘«Sou Feliz, Feliz, Feliz» - Biografia espiritual da Irmã Clare Crockett’ e, claro, ‘«Só n’Ele» confio - Biografia espiritual de São de Alenquer’. “É uma opção pastoral, que pode ser o melhor e maior contributo para a pastoral juvenil nos nossos dias, que surgiu inicialmente quando estava em Peniche, com o desejo de chegar aos surfistas; depois, na linha do Sínodo dos Bispos para os Jovens, na altura do Guido, para mostrar a santidade aos jovens; e daí ganhei o gosto e, com a convocação da Jornada Mundial da Juventude para Lisboa, percebi que Nosso Senhor continua a pedir-me que foque atenção nos jovens. A chave tem sido mostrar aos jovens que a santidade, o Evangelho, é possível em qualquer idade. Os jovens são chamados a ser santos”, garante ao Jornal VOZ DA VERDADE o sacerdote, ainda jovem, de 33 anos.

texto por Diogo Paiva Brandão; fotos por DPB e Instituto da Sãozinha
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