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Pe. Alexandre Palma
Comunicar e comunicar-se
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Há muito que a tecnologia se introduziu nas nossas vidas e as vem transformando. A comunicação é, a meu ver, uma das dimensões desse nosso viver em que essa transformação é mais sensível. Dir-se-á que o que se alterou foram, fundamentalmente, os meios, isto é, os instrumentos através dos quais comunicamos. As conversas que outrora teríamos em casa com familiares, na rua com conhecidos ou no trabalho com colegas migraram agora para os telefones, os emails ou as redes sociais. Julgo que isso é, em parte, verdade. Mas só em parte. É que se tiver razão o canadiano Marshall McLuhan, «o meio é a mensagem». Haverá nesta afirmação um quê de exagero. Talvez a relação entre meio de comunicação e mensagem comunicada não seja de pura identificação. Mas será, seguramente, de recíproco condicionamento. E é por isto que comunicar mediante novos instrumentos não é apenas mais do mesmo. Há qualquer coisa de novo que se introduz na nossa forma de comunicar e que, por essa via, a transforma.

Ocorre-me pensar nisto por causa de algumas experiências frustradas de comunicação através de emails, sms ou ferramentas do género. E não me estou a referir ao senhor ministro das Finanças! Estou a referir-me às minhas próprias experiências, em que esses meios não garantiram uma efetiva comunicação. Antes a dificultaram. Com efeito, as novas possibilidades de comunicação que a tecnologia coloca ao nosso alcance mostram, quotidianamente, não apenas as suas virtualidades, mas também os seus limites. A impessoalidade destes modos de comunicação, associados à imediatez que eles permitem e estimulam, levam-nos (por vezes) a dizer o que não queremos, de uma forma que nunca usaríamos. E isto não acontece só nas abomináveis caixas de comentário ou em debates online. É como se o nosso lado mais primário, que ordinariamente fazemos por conter, encontrasse ali um espaço para se expandir. Noutros casos, a comunicação parece frustrada por estranhos equívocos. Diria que estas plataformas são bastante incompetentes para lidar com jogos de palavras ou trocadilhos. Ou melhor, que nós nelas nos tornamos assim, tão propensos para o sentido literal das palavras que nos esquecemos que também existem metáforas. À partida, inclino-me a pensar que estes instrumentos não serão o melhor contexto para explorar as incríveis capacidades expressivas da linguagem humana. Esquecê-lo, como por vezes me tem sucedido, pode ser uma fonte de curiosos equívocos.

Estas considerações não são, de forma alguma, um manifesto contra as mais recentes ferramentas de comunicação. Com elas não se ignora que estas ferramentas, tantas vezes, facilitam e agilizam a comunicação entre nós. Elas são apenas um fruto das tais experiências fracassadas de comunicação e, sobretudo, da perceção de algo decisivo que tantas vezes lhes falta: a presença do outro. É que o cara-a-cara, muito embora não resolvendo tudo, resolverá muito dos excessos e dos equívocos desta comunicação mediatizada. A tecnologia reforça, por esta via, o que há muito já sabemos ou deveríamos saber: comunicar é mais que dizer. Comunicar é comunicar-se.