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Pe. Alexandre Palma
Estudar
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A filósofa francesa Simone Weil (1909-1946) tinha o estudo em alta conta. Segundo dizia, «os estudos escolares são um desses campos que encerram uma pérola pela qual vale a pena vender todos os bens, sem nada guardar para si, a fim de a poder comprar». Ela lia assim, com a parábola de Jesus, a experiência tão humana de estudar (experiência exclusivamente humana). Via no estudo um terreno rico de tesouros. Algo que, certamente, contrasta com visões do estudo que lhe exaltam outras dimensões, como a dificuldade ou a utilidade. Para o espírito inquieto e para a inteligência sensível de Simone Weil, o estudo era mesmo um elemento decisivo na caminhada espiritual. Para ela, o estudo preparava para a oração, pois por ele se educa a atenção e rezar é fundamentalmente isto: dar atenção a Deus.

Julgo que nos fará bem recuperar um entendimento profundo do ato de estudar. Estamos muito contaminados por uma visão excessivamente utilitarista do estudo. Resisto profundamente a esta redução, muito em voga num tempo que exalta a técnica e a eficácia acima de tudo o mais. Estou em crer que muito nos escapará se apenas nos perguntarmos: isto ou aquilo que estudo, para que serve? Algo disto terá de haver, não o nego. Mas não podemos avaliar ou validar o que se estuda apenas pelo que serve, sobretudo quando essa avaliação está demasiado tomada por considerações de curto prazo e por um entendimento demasiado estreito daquilo que nos é útil. Arrisco-me a dizer que todos nós, de uma forma ou de outra, estudámos e sabemos coisas que não nos foram imediatamente úteis nem nos servem quotidianamente para nada. E ainda assim encontrámos nesse estudo e no conhecimento por ele gerado um tal gozo interior que em tudo se assemelha à tal descoberta de uma pérola preciosa escondida num campo.

Corremos o risco de ter esquecido algo fundamental: o primeiro grande fruto do estudo é o estudante. Só secundariamente o serão também os conhecimentos práticos ou teóricos por ele veiculados. Porque independentemente de tudo o mais, pelo estudo, qualquer que seja a sua área, educamo-nos para o trabalho, para a concentração, para a perseverança, para a superação de obstáculos, para o sucesso e para o fracasso. No fundo, nele se educa e molda o carácter do estudante. E isto é superiormente útil e prático, mesmo se a um nível diferente daquele a que estamos habitados a pensar. Pelo estudo o estudante potencia o que em si são capacidades e ultrapassa o que em si são limitações. Pelo estudo o estudante descobre a vida, o mundo e, sobretudo, descobre-se a si próprio e, nesse processo, vai sendo transformado. Por isso, julgo poder dizer que o se o estudo não humaniza, então ele terá falhado o seu fim primeiro. Este é um triste efeito dessa tal redução funcionalista do estudo e da aprendizagem: gera só técnicos quando deveria também gerar pessoas. Um olhar personalista do estudo deverá, pois, entre nós, ocupar esse espaço onde sobra este funcionalismo. Para bem do estudo, mas sobretudo para bem do estudante.