Editorial |
P. Nuno Rosário Fernandes
O rapaz que queria ser rapariga
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Nos últimos tempos, o tema da ideologia de género tem sido motivo de notícia e de muitas discussões. Porque considero um tema pertinente para o qual precisamos estar atentos, gostaria de recuperar, aqui, um texto que publiquei neste jornal, no ano 2016. Passaram três anos da publicação do documento da Conferência Episcopal Portuguesa sobre a ideologia de género, um texto elogiado e de referência, citado, inclusive, pela Santa Sé.

 

António e Joana são um casal feliz. Na sua meia-idade, apesar da instabilidade dos seus empregos, fruto da época em que estamos, vivem com alegria e testemunham essa mesma felicidade. Os seus dois filhos, a Sofia e o Tiago, frequentam a escola no 5º e 7º ano de escolaridade. Os dois vão à Catequese na sua Paróquia e o Tiago até gosta de servir ao altar.

Recentemente, Tiago chegou a casa com muitas perguntas que deixaram os pais perplexos e preocupados. Na Escola, o Tiago ouviu um seu colega, rapaz, dizer que não gostava da sua sexualidade e queria, por isso, ser rapariga. Um seu professor, apoiando a causa, chegou mesmo a falar de uma teoria que Tiago já tinha ouvido falar na televisão mas que não percebia o que era: a ideologia do género.

O professor citou, então, uma frase que diz: “uma mulher não nasce mulher, torna-se mulher”. Esta frase, de autoria de Simone Beauvoir, explicou o professor, é ponto de partida para esta ideologia que considera que somos homens ou mulheres não na base da dimensão biológica em que nascemos, mas nos tornamos tais de acordo com o processo de socialização. Por conseguinte, o género deve sobrepor-se ao sexo e a cultura deve impor-se à natureza.

Tiago, mostrando os apontamentos daquela aula em que o seu professor defendia acerrimamente esta teoria, fez ver aos pais que para esta ideologia, o género é uma construção social, e por isso mesmo este pode ser desconstruído e reconstruído. Pelo que, se a diferença sexual entre homem e mulher está na base da opressão desta, então qualquer forma de definição de uma especificidade feminina é opressora para a mulher. Por isso, a maternidade como especificidade feminina é sempre uma discriminação injusta. Assim, para superar essa opressão, recusa-se a diferenciação sexual natural e reconduz-se o género à escolha individual. Ou seja, o género não tem de corresponder ao sexo, mas pertence a uma escolha subjectiva, ditada por instintos, impulsos, preferência e interesses, o que vai para além dos dados naturais e objectivos.

Deste modo, se é indiferente a escolha do género a nível individual, podendo escolher-se ser homem ou mulher independentemente dos dados naturais, também é indiferente a escolha de se ligar a pessoas de outro ou do mesmo sexo. Deixa-se assim de falar em família e passa a falar-se em famílias.

Com esta descrição no caderno de Tiago, os seus pais ficaram apavorados, sobretudo pelo que começavam a ensinar na Escola, levando a crer que privilegiar a união heterossexual afigura-se a esta teoria como uma forma de discriminação. Por outro lado, e isso então deixou Tiago muito angustiado, porque gosta muito de seu pai e de sua mãe e de os chamar assim mesmo (pai e mãe), deixa de se falar em paternidade e maternidade e passa a falar-se, exclusivamente, em parentalidade, criando um conceito abstrato, pois desligado da geração biológica. Tiago ficou mesmo confuso.

Depois de ler o caderno de Tiago, e de ouvir as suas lamentações, observações e perguntas, o pai de Tiago procura explicar que esta teoria, chamada ideologia do género, salientando que esta teoria opõe-se radicalmente à visão bíblica e cristã da pessoa e da sexualidade humanas. Conversando pacientemente com o seu filho, António referia que o corpo sexuado, como todas as criaturas do nosso Deus, é produto bom de um Deus bom e amoroso. Uma segunda verdade a considerar na visão cristã da sexualidade, diz, é a da pessoa humana como espírito encarnado e, por isso, sexuado: a diferenciação sexual correspondente ao desígnio divino sobre a criação, em toda a sua beleza e plenitude: «Ele os criou homem e mulher».

A pessoa humana, continuava António ao seu filho Tiago, é a totalidade unificada do corpo e da alma, existe necessariamente, como homem ou mulher. Por conseguinte, a dimensão sexuada, a masculinidade ou feminilidade, é constitutiva da pessoa, é o seu modo de ser, não um simples atributo. É a própria pessoa que se exprime através da sexualidade. A pessoa é, assim, chamada ao amor e à comunhão como homem ou como mulher.

Com o desenrolar da conversa o tempo foi passando e logo chegou a hora do descanso de Tiago para mais um dia de aulas. Mas António prometeu a Tiago continuar o assunto, até porque é importante conhecer e esclarecer o que normalmente na comunicação social não é devidamente explicado.

Em síntese podemos acentuar que “a ideologia do género não só contrasta com a visão bíblica e cristã, mas também com a verdade da pessoa e da sua vocação. Prejudica a realização pessoal e, a médio prazo, defrauda a sociedade. Não exprime a verdade da pessoa, mas distorce-a ideologicamente”.

Documento ‘A propósito da ideologia do género’: www.conferenciaepiscopal.pt.

 

Editorial, pelo P. Nuno Rosário Fernandes, diretor p.nunorfernandes@patriarcado-lisboa.pt

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